Verruga plantar
(Versão Completa)
Etiologia
A causa da verruga plantar não é um único vírus, mas sim, um grupo de vírus não-envelopados que estão categorizados em mais de 150 tipos de acordo com as suas semelhanças em termos de sequência de ADN, sendo posteriormente classificados em espécies de 1 a 5 géneros: α, β, γ, µ, e ν[i].
As espécies HPV já isoladas em verruga plantar incluem HPV-1, -2, -3, -4, -27, -29, -57, -60, -63, -65, -66, e -69, das quais 88% estão associados aos tipos 1, 2, 27 e 57, sendo o mais distinto em termos de perfil clínico o tipo 1[ii].
A transmissão dá-se por contacto direto com partículas virais.
Epidemiologia e Fatores de Risco
Estima-se que cerca de 40% da população esteja infetada com HPV mas apenas 7 a 12% desenvolverão verruga plantar[iii].
Esta exibe uma incidência anual de cerca de 14% e os fatores de risco apontados mais usualmente são:
- Exposição prolongada a HPV
- Dano tecidular/fragilidade na barreira epidérmica
- Resposta imunitária debilitada/diminuída
A incidência varia de acordo com o género, idade, raça e estado de saúde, mas também é influenciada pela localização geográfica, sazonalidade, comportamento e fatores socioeconómicos, sendo, no entanto, clara a sua maior incidência nos meses de inverno, frios e húmidos.
Verruga plantar – Fisiopatologia
O HPV consegue sobreviver nas superfícies por muitos meses[iv]. O processo de infeção do hospedeiro dá-se quer por contacto direto com a verruga plantar, como por contacto indireto via fómite, como o chão, meias, toalhas, equipamento desportivo, etc.
Neste tipo de contágio o HPV não tem fase virémica nem disseminação sistémica, o que faz com que o contacto com fluidos corporais (exceção para aqueles emanados pela própria lesão) não transmitam o vírus[v].
A existência de uma solução de continuidade na pele (ferida ou microtrauma) plantar permite a entrada do vírus[vi] o qual, quando em contacto com o hospedeiro, penetra a camada epitelial basal onde as células estaminais se encontram em divisão[vii]. É neste ambiente que o vírus se liga aos recetores celulares e dá entrada nas células, que se tornam infetadas[viii].
Após um período de incubação de 1 a 20 meses, o ADN viral estabelece-se dentro da célula-hospedeira, usualmente, sem integração no seu genoma e está instalada a infeção[ix].
Assim que a infeção ocorre, uma de 3 situações é expectável:
- Clearance da infeção – imunidade a este tipo particular de HPV
- Infeção latente
- Manifestação clínica – verruga plantar[x]
Caso o processo infecioso suceda sem clearance, o queranócito basal é estimulado a dividir e replicar o ADN viral via proteínas HPV E1 e E2, processo que produz diversas células estaminais em que cada contêm entre 20 a 100 cópias do ADN viral[xi].
As células em si, contêm baixos níveis de proteína viral o que permite que o agente evada a resposta imune.
À medida que as células basais se diferenciam em queratinócitos, progridem em direção à superfície epitelial ao mesmo tempo que o promotor de genoma viral é ativado, aumentando a produção de proteínas virais que potenciam a amplificação genómica do HPV entre cada uma das fases de diferenciação celular. É possível que a proteína de membrana E5 produzida via ADN viral sirva para potenciar a sinalização de fator de crescimento o que, por sua vez, capacita a replicação de ADN celular.
Assim que as cópias de ADN viral são suficientes, as proteínas capsulares virais L1 e L2 são expressas na superfície dos queranócitos[xii].
As proteínas E2 recrutam cópias do ADN viral para o núcleo onde este é envolto em cápsides compostas por proteínas L1 e L2 podendo estas partículas serem libertadas em grandes quantidades através da descamação da superfície dos queranócitos, potenciando assim a infeção de outros hospedeiros[xiii].
A indução da replicação celular através do processo de amplificação do genoma viral leva a uma pápula hiperqueratinizada característica da verruga plantar, a qual tende a desenvolver-se em zonas onde o pé esteja sob maior pressão como as cabeças metatársicas e calcanhar. São esses pontos de pressão que potenciam o microtrauma da barreira da epiderme a qual aumenta a possibilidade da invasão por HPV.
É também por ação desta pressão que a lesão tende a progredir para o interior da pele (o chamado «efeito iceberg») ao invés de se formar apenas uma pápula exterior, sendo este um dos principais motivos da resistência ao tratamento[xiv].
Como resultado da descamação normal do epitélio, as partículas virais são libertadas e podem ser transmitidas às superfícies onde o vírus permanecerá até ser captado por um novo hospedeiro ou se espalhar para locais adjacentes (autoinoculação). Assim, uma vez que uma verruga plantar se desenvolve, o hospedeiro é suscetível ao desenvolvimento de verrugas adicionais[xv].
Sessenta e cinco a 78% das verrugas cutâneas regridem em 2 anos[xvi] no entanto, em indivíduos maiores de 12 anos, o rácio de regressão espontânea diminui significativamente[xvii].
A regressão de verrugas depende do desenvolvimento de uma resposta celular imune eficaz[xviii]. Contudo, a capacidade em evadir o sistema imunitário do hospedeiro faz com que, mesmo indivíduos saudáveis, possam ser infetados[xix].
Na maioria das pessoas saudáveis a infeção por HPV é controlada através de uma resposta imune que se inicia ao contacto com as partículas virais. O antigene viral é verificado pelas células de Langerhans as quais migram para o sistema linfático e posteriormente chegam a um nódulo linfático onde apresentam o antigene a um linfócito T o qual se ativa e induz uma resposta específica na área do contacto viral. As células apresentadoras de antigénio ativam os queranócitos a libertar citoquinas inflamatórias e promove-se a migração de neutrófilos e monócitos bem como a ativação e migração de linfócitos Th, maturação de células B e a atividade de células natural-killer (NK).
Os queranócitos libertam fator de necrose tumoral α, o que potencia o reconhecimento de queranócitos infetados por parte de linfócitos T os quais destroem os queranócitos infetados. Esta é a resposta que origina a erradicação da infeção e previne o aparecimento da lesão/verruga e/ou a sua regressão, formando-se células B produtoras de anticorpos específicos, responsáveis por resposta humoral. É quando este processo falha que a verruga se torna estabelecida.
[i] King CM, Johnston JS, Ofili K, Tam M, Palefsky J, Da Costa M, Mathur Y, Barbosa P. Human papillomavirus types 2, 27, and 57 Identified in plantar verrucae from HIV-positive and HIV-negative individuals. J Am Podiatr Med Assoc. 2014 Mar;104(2):141-6. doi: 10.7547/0003-0538-104.2.141. PMID: 24725033.
[ii] Bruggink SC, de Koning MN, Gussekloo J, Egberts PF, Ter Schegget J, Feltkamp MC, Bavinck JN, Quint WG, Assendelft WJ, Eekhof JA. Cutaneous wart-associated HPV types: prevalence and relation with patient characteristics. J Clin Virol. 2012 Nov;55(3):250-5. doi: 10.1016/j.jcv.2012.07.014. Epub 2012 Aug 11. PMID: 22884670.
[iii] Barna Z, Kádár M. The risk of contracting infectious diseases in public swimming pools. A review. Ann Ist Super Sanita. 2012;48(4):374-86. doi: 10.4415/ANN_12_04_05. PMID: 23247134.
[iv] Berry JM, Palefsky JM. A review of human papillomavirus vaccines: from basic science to clinical trials. Front Biosci. 2003 May 1;8:s333-45. doi: 10.2741/1003. PMID: 12700045.
[v] Warts and verrucas: assessment and treatment. The Pharmaceutical Journal, PJ, 20 June 2015, Vol 294, No 7867;294(7867):DOI:10.1211/PJ.2015.20068680
[vi] Longworth MS, Laimins LA. Pathogenesis of human papillomaviruses in differentiating epithelia. Microbiol Mol Biol Rev. 2004 Jun;68(2):362-72. doi: 10.1128/MMBR.68.2.362-372.2004. PMID: 15187189; PMCID: PMC419925.
[vii] Doorbar, John. ‘Papillomavirus Life Cycle Organization and Biomarker Selection’. 1 Jan. 2007 : 297 – 313.
[viii] Sterling JC, Gibbs S, Haque Hussain SS, Mohd Mustapa MF, Handfield-Jones SE. British Association of Dermatologists’ guidelines for the management of cutaneous warts 2014. Br J Dermatol. 2014 Oct;171(4):696-712. doi: 10.1111/bjd.13310. Epub 2014 Oct 1. PMID: 25273231.
[ix] Witchey, Dexter Jordan, Witchey, Nichole Brianne, Roth-Kauffman, Michele Marie and Kauffman, Mark Kevin. “Plantar Warts: Epidemiology, Pathophysiology, and Clinical Management” Journal of Osteopathic Medicine, vol. 118, no. 2, 2018, pp. 92-105. https://doi.org/10.7556/jaoa.2018.024
[x] Bruggink SC, Eekhof JA, Egberts PF, van Blijswijk SC, Assendelft WJ, Gussekloo J. Warts transmitted in families and schools: a prospective cohort. Pediatrics. 2013 May;131(5):928-34. doi: 10.1542/peds.2012-2946. Epub 2013 Apr 22. PMID: 23610204.
[xi] Longworth MS, Laimins LA. Pathogenesis of human papillomaviruses in differentiating epithelia. Microbiol Mol Biol Rev. 2004 Jun;68(2):362-72. doi: 10.1128/MMBR.68.2.362-372.2004. PMID: 15187189; PMCID: PMC419925.
[xii] Doorbar J, Egawa N, Griffin H, Kranjec C, Murakami I. Human papillomavirus molecular biology and disease association. Rev Med Virol. 2015 Mar;25 Suppl 1(Suppl Suppl 1):2-23. doi: 10.1002/rmv.1822. PMID: 25752814; PMCID: PMC5024016.
[xiii] Sanclemente G, Gill DK. Human papillomavirus molecular biology and pathogenesis. J Eur Acad Dermatol Venereol. 2002 May;16(3):231-40. doi: 10.1046/j.1473-2165.2002.00419.x. PMID: 12195562.
[xiv] King CM, Johnston JS, Ofili K, Tam M, Palefsky J, Da Costa M, Mathur Y, Barbosa P. Human papillomavirus types 2, 27, and 57 Identified in plantar verrucae from HIV-positive and HIV-negative individuals. J Am Podiatr Med Assoc. 2014 Mar;104(2):141-6. doi: 10.7547/0003-0538-104.2.141. PMID: 24725033.
[xv] Johnson LW. Communal showers and the risk of plantar warts. J Fam Pract. 1995 Feb;40(2):136-8. PMID: 7852935.
[xvi] Singh S, Chouhan K, Gupta S. Intralesional immunotherapy with killed Mycobacterium indicus pranii vaccine for the treatment of extensive cutaneous warts. Indian J Dermatol Venereol Leprol. 2014 Nov-Dec;80(6):509-14. doi: 10.4103/0378-6323.144145. PMID: 25382507.
[xvii] Bavinck JN, Eekhof JA, Bruggink SC. Treatments for common and plantar warts. BMJ. 2011 Jun 7;342:d3119. doi: 10.1136/bmj.d3119. PMID: 21652749.
[xviii] Shaheen MA, Salem SA, Fouad DA, El-Fatah AA. Intralesional tuberculin (PPD) versus measles, mumps, rubella (MMR) vaccine in treatment of multiple warts: a comparative clinical and immunological study. Dermatol Ther. 2015 Jul-Aug;28(4):194-200. doi: 10.1111/dth.12230. Epub 2015 Apr 6. PMID: 25847793.
[xix] Landini MM, Borgogna C, Peretti A, Doorbar J, Griffin H, Mignone F, Lai A, Urbinati L, Matteelli A, Gariglio M, De Andrea M. Identification of the skin virome in a boy with widespread human papillomavirus-2-positive warts that completely regressed after administration of tetravalent human papillomavirus vaccine. Br J Dermatol. 2015 Aug;173(2):597-600. doi: 10.1111/bjd.13707. Epub 2015 Jun 25. PMID: 25639663.