Ozono, Feridas e Cicatrização
(Versão Completa)
O aumento do envelhecimento e diabetes, juntamente com programas de saúde inadequados, enfatizam o problema de ter que lidar com mais de 1.5 biliões de pessoas afectadas com doenças infecciosas da pele e mucosas, devido a bactérias, vírus, protozoários e distúrbios do metabolismo. É comum a observação clínica de doenças como pé diabético, escaras, úlceras de traumatismo ou queimaduras, infecções virais crónicas devidas a herpes I e II, papiloma humano e infecções vaginais devidas a Candida, Trichomonas ou Chlamidia, infecções da mucosa anal como rágadas e abcessos fistulares, bem como úlceras aftosas na boca.
Estas infecções raramente são mortais, mas são consideravelmente causadoras de preocupação (e cronicidade) especialmente em doentes diabéticos e/ou cardiovasculares, portadores de HIV e adictos, apresentando muitas vezes hipoxia dos tecidos.
Usualmente, este quadro origina medicação cara e não muito eficaz já que uma infeção em tecido hipóxico apresenta Staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA) e Pseudomonas aeruginosa, o que faz com que o doente fique frustrado pela falta de resultado do tratamento – verificada pela não cicatrização dos tecidos[i] – e consequentemente entre em incumprimento do tratamento.
A cicatrização é um processo multifásico que envolve coagulação sanguínea, inflamação, proliferação tecidular e remodelação[ii] mas, caso exista fragilidade do sistema imunitário comummente observada nas infecções crónicas, dificilmente se dará da forma correta e nem mesmo a utilização de fatores de crescimento poderá ajudar em úlceras crónicas amplamente infectadas. Facto é que a cicatrização é um processo crítico para a pele e é sabido ser afetado pelo stress oxidativo bem como diminuir com o envelhecimento[iii].
Ainda assim, apesar do processo exacto de cicatrização ser complexo, sabe-se que se inicia com a transformação de queratócitos em células capazes de replicar e migrar, expressando diversas moléculas que promovem a invasão da matriz epitelial danificada e consequente reepitelização da superfície da ferida[iv].
Óleos Ozonizados
Quando o sangue é ozonizado, este reage com os antioxidantes solúveis e ácidos gordos polinsaturados, oxidando-os[v]. Como resultado da reação com o ozono estes PUFA, que se caracterizam pela presença de ligações duplas, vêm-nas ser oxidadas e ligadas a um átomo de oxigénio. Desta observação, nascem os óleos ozonizados, os quais são utilizados em diversas patologias como articular e, especialmente, dermatológica[vi].
A utilização de óleos de ozono parece promissora, especialmente no processo de cicatrização de feridas/doenças de pele, primariamente porque elimina agentes patogénicos, mas também por ser capaz de libertar oxigénio, ativar proliferação de fibroblastos e desta forma promover a reconstrução da matriz intercelular, promover a proliferação de queratinoblastos e cicatrização.
Como os óleos ozonizados efetivamente funcionam mantêm-se na teoria sendo no entanto postulado que, quando o triozonido estável entra em contacto com o exsudado (que está quente), decompõem-se em diferentes peróxidos os quais rapidamente se dissolvem, gerando peróxidos de hidrogénio, o que explica a sua atividade desinfetante e estimulante. À exposição a ozono está também associada a ativação do fator de transcrição beta (TGF-β) o qual é um fator crítico na remodelação tecidular[vii].
O tratamento tópico com ozono apresenta já diversos estudos e meta-análises de sucesso em herpes zoster[viii], psoríase[ix], queimaduras de segundo grau (com resultados melhores que o ácido hialurónico[x]), úlcera varicosa da perna[xi], periodontite[xii], eritrasma interdigital[xiii], entre outros.
[i] Chronic wound care. Lancet. 2008 Nov 29;372(9653):1860-1862. doi: 10.1016/S0140-6736(08)61793-6.
[ii] Wound healing – aiming for perfect skin regeneration. Science. 1997 Apr 4;276(5309):75-81.
[iii] Delayed wound healing in aged rats is associated with increased collagen gel remodeling and contraction by skin fibroblasts, not with differences in apoptotic or myofibroblast cell populations. Wound Repair Regen. 2001 May-Jun;9(3):223-37.
Age-associated changes in human epidermal cell renewal. J Gerontol. 1983 Mar;38(2):137-42.
[iv] Regulation of wound healing by growth factors and cytokines. Physiol Rev. 2003 Jul;83(3):835-70.
[v] Chemical kinetics measurements on the reaction between blood and ozone. Int J Biol Macromol. 2005 Jul;36(1-2):61-5.
[vi] Therapeutic effects of topical application of ozone on acute cutaneous wound healing. J Korean Med Sci. 2009 Jun;24(3):368-74. doi: 10.3346/jkms.2009.24.3.368.
[vii] The role of connective tissue growth factor, a multifunctional matricellular protein, in fibroblast biology. Biochem Cell Biol. 2003 Dec;81(6):355-63.
[viii] Topical ozone therapy: An innovative solution to patients with herpes zoster. Zhong Nan Da Xue Xue Bao Yi Xue Ban. 2018 Feb 28;43(2):168-172. doi: 10.11817/j.issn.1672-7347.2018.02.011.
[ix] Clinical efficacy of ozonated oil in the treatment of psoriasis vulgaris. Zhong Nan Da Xue Xue Bao Yi Xue Ban. 2018 Feb 28;43(2):173-178. doi: 10.11817/j.issn.1672-7347.2018.02.012.
[x] Topical ozonated oil versus hyaluronic gel for the treatment of partial- to full-thickness second-degree burns: A prospective, comparative, single-blind, non-randomised, controlled clinical trial. Burns. 2013 Sep;39(6):1178-83. doi: 10.1016/j.burns.2013.03.002.
[xi] Randomized, controlled study of innovative spray formulation containing ozonated oil and α-bisabolol in the topical treatment of chronic venous leg ulcers. Adv Skin Wound Care. 2015 Sep;28(9):406-9. doi: 10.1097/01.ASW.0000470155.29821.ed.
[xii] The use of ozonated sea buckthorn oil in the prevention and treatment of tobacco dependence periodontitis in the experiment. Lik Sprava. 2014 Dec;(12):91-4.
[xiii] Treatment of interdigital foot Erythrasma with ozonated olive oil. Rev Med Inst Mex Seguro Soc. 2016 Jul-Aug;54(4):458-61.